Antes da criança chegar à escola, já passou por processos de educação importantes: pelo familiar e pela mídia eletrônica. No ambiente familiar, mais ou menos rico cultural e emocionalmente, a criança vai desenvolvendo as suas conexões cerebrais, os seus roteiros mentais, emocionais e suas linguagens. Os pais, principalmente a mãe, facilitam ou complicam, com suas atitudes e formas de comunicação mais ou menos maduras, o processo de aprender a aprender dos seus filhos.
A criança também é educada pela mídia, principalmente pela televisão. Aprende a informar-se, a conhecer - os outros, o mundo, a si mesmo - a sentir, a fantasiar, a relaxar, vendo, ouvindo, "tocando" as pessoas na tela, que lhe mostram como viver, ser feliz e infeliz, amar e odiar. A relação com a mídia eletrônica é prazerosa - ninguém obriga - é feita através da sedução, da emoção, da exploração sensorial, da narrativa - aprendemos vendo as estórias dos outros e as estórias que os outros nos contam.
Mesmo durante o período escolar a mídia mostra o mundo de outra forma - mais fácil, agradável, compacta - sem precisar fazer esforço. Ela fala do cotidiano, dos sentimentos, das novidades. A mídia continua educando como contraponto à educação convencional, educa enquanto estamos entretidos.
A educação escolar precisa compreender e incorporar mais as novas linguagens, desvendar os seus códigos, dominar as possibilidades de expressão e as possíveis manipulações. É importante educar para usos democráticos, mais progressistas e participativos das tecnologias, que facilitem a evolução dos indivíduos. O poder público pode propiciar o acesso de todos os alunos às tecnologias de comunicação como uma forma paliativa, mas necessária de oferecer melhores oportunidades aos pobres, e também para contrabalançar o poder dos grupos empresariais e neutralizar tentativas ou projetos autoritários.
Se a educação fundamental é feita pelos pais e pela mídia, urgem ações de apoio aos pais para que incentivem a aprendizagem dos filhos desde o começo das vidas deles, através do estímulo, das interações, do afeto. Quando a criança chega à escola, os processos fundamentais de aprendizagem já estão desenvolvidos de forma significativa. Urge também a educação para as mídias, para compreendê-las, criticá-las e utilizá-las da forma mais abrangente possível.
A educação para os meios começa com a sua incorporação na fase de alfabetização. Alfabetizar-se não consiste só em conscientizar os códigos da língua falada e escrita, mas dos códigos de todas as linguagens do homem atual e da sua interação. A criança, ao chegar à escola, já sabe ler histórias complexas, como uma telenovela, com mais de trinta personagens e cenários diferentes. Essas habilidades são praticamente ignoradas pela escola, que, no máximo, utiliza a imagem e a música como suporte para facilitar a compreensão da linguagem falada e escrita, mas não pelo seu intrínseco valor. As crianças precisam desenvolver mais conscientemente o conhecimento e prática da imagem fixa, em movimento, da imagem sonora ... e fazer isso parte do aprendizado central e não marginal. Aprender a ver mais abertamente, o que já estão acostumadas a ver, mas que não costumam perceber com mais profundidade (como os programas de televisão).
/www.eca.usp.br/prof/moran/midias_educ.htm